Mais um importante
apoio na derrubada do Cota Zero. Na última sexta-feira (16.02), a Associação
Juízas e Juízes para a Democracia publicou uma nota pública a favor da luta das
pescadoras e pescadores artesanais de Mato Grosso contra a Lei estadual
12.197/2023. O caso ainda segue sob julgamento no Supremo Tribunal Federal
(STF).
Diz um trecho da
nota que "a tramitação do projeto de lei pelo Governo de
Mato Grosso não oportunizou a escuta das populações atingidas, assim como
desconsiderou por completo diversos estudos científicos e técnicos sob os
impactos ambientais e sociais da referida legislação."
A Associação, que reúne magistrados de todo o Brasil, cita ainda que o Cota
Zero "ao instituir o Auxílio Pecuniário aos Pescadores Profissionais
Artesanais do Estado de Mato Grosso, para conceder, durante três anos e fora do
período do defeso, apoio financeiro aos pescadores artesanais (que estarão
proibidos de exercer sua profissão), impõe aos pescadores outra profissão como
condição para o recebimento; não promove a recomposição integral da renda
perdida; gerando, ainda, impactos previdenciários com a retirada compulsória da
previdência social."
A nota destaca também a preocupação da AJD com os impactos culturais, sociais e
ambientais da proposta do Governo, que afeta comunidades rurais negras, pobres
e tradicionais, inviabilizando o seu modo de vida e a subsistência em
desrespeito à Constituição e aos Direitos Fundamentais.
Nas últimas semanas, representantes da Associação participaram de reuniões com
organizações socioambientais de Mato Grosso, entre elas o Formad, para
entendimento do caso.
A entidade demonstrou bastante interesse nas inconsistências envolvendo o Cota
Zero, além de ter prestado informações jurídicas sobre o processo. A
inconstitucionalidade da Lei sancionada pelo Governo estadual ainda está sob
avaliação do Supremo Tribunal Federal (STF), que julga três ações com o pedido
de suspensão dos efeitos da legislação.
A entidade expediu uma nota:
A Associação Juízas e Juízes para
a Democracia vem a público manifestar o seu apoio à luta das pescadoras e
pescadores artesanais do Mato Grosso contra a Lei estadual 12.197/2023,
que altera dispositivos na Lei 9.096/2009, sobre a Política de Pesca
naquele estado.
A referida legislação, objeto de
Ações Diretas de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (ADIs n. 7471, n. 7514 e n.
7590, Relator Ministro André Mendonça),
determina a proibição geral e imediata da pesca artesanal profissional no Estado pelo período de cinco anos, sob a
justificativa, não comprovada, de proteção
dos estoques pesqueiros. A tramitação do projeto de lei pelo Governo do Mato Grosso não oportunizou a escuta das
populações atingidas, assim como desconsiderou
por completo diversos estudos científicos e técnicos sob os impactos ambientais e sociais da referida legislação.
Em Mato Grosso inexiste pesca
industrial, a pesca se dá de forma artesanal. A pesca comercial artesanal é “praticada
diretamente por pescador profissional, de forma
autônoma ou em regime de economia familiar, com meios de produção próprios ou mediante contrato de parceria,
desembarcado, podendo utilizar embarcações
de pequeno porte” (inciso I, alínea a, do art. 8°, da lei n° 11.959/2009 – Lei Geral da Pesca). Além de ser a profissão e
meio principal de vida, a pesca artesanal
representa um modo de vida de cerca de 15.000 pescadoras e pescadores de comunidades tradicionais e povos
do Mato Grosso.
A Lei estadual ao instituir o
Auxílio Pecuniário aos Pescadores Profissionais Artesanais do Estado de Mato Grosso, para
conceder, durante três anos e fora do período
do defeso, apoio financeiro aos pescadores artesanais (que estarão proibidos de exercer sua profissão), impõe aos
pescadores outra profissão como condição
para o recebimento; não promove a recomposição integral da renda perdida; gerando, ainda, impactos
previdenciários com a retirada compulsória da previdência social.
Referida legislação impacta
diretamente o modo de vida do grupo social, seus direitos fundamentais como pescadores/as
artesanais, guardiões dos rios, inviabilizando
a realização da justiça socioambiental ao proibir o exercício legítimo, digno e tradicional da pesca artesanal
profissional. A vedação do direito ao trabalho e geração de renda comprometem a própria
sobrevivência e segurança alimentar de milhares
de famílias, sob o falso argumento de proteção ambiental por precaução e prevenção. Contrariando os diversos estudos
técnico-científicos sobre os impactos ambientais
e diminuição dos estoques pesqueiros, o poder executivo estadual
atribuiu aos/às pescadores/as
artesanais profissionais a responsabilidade pela infundada e não comprovada diminuição dos
estoques pesqueiros.
A atividade pesqueira é um elemento da dimensão existencial das pescadoras e pescadores de comunidades tradicionais, e por ser uma atividade de caráter tradicional e relacionada à identidade, é evidente que a proibição da pesca profissional artesanal pelo período de cinco anos viola o princípio da dignidade humana e também os direitos culturais dos pescadores artesanais, privados de um elemento central de sua dimensão existencial. A AJD vê com extrema preocupação os impactos culturais, sociais e ambientais que a referida legislação está promovendo ao proibir a prática da pesca por comunidades rurais negras, pobres e tradicionais, inviabilizando o seu modo de vida e subsistência em desrespeito à Constituição e aos Direitos Fundamentais.
Associação Juízas e Juízes para a Democracia (AJD) - 16 de fevereiro de 2024